Tenho convivido com uma dificuldade muito comum entre os executivos brasileiros: inovar.
Infelizmente, filhos de uma cultura colonizada, educados para subir na vida adequandose a comportamento de manual, com decisões protegidas pelas “melhores práticas” e por pesquisas de mercado, a maioria de nossos executivos não sabe exercer sua sensibilidade, seu senso crítico e pensar por conta própria.
Não é raro ver a reação surpresa -“Como assim?!” - de um gerente quando perguntado sobre sua opinião pessoal relativa a um projeto.
Se por um lado, ninguém tem culpa porque isso é uma herança; por outro, todos temos a responsabilidade de buscar essa autonomia de pensamento se queremos fazer diferença e ser competitivos nesse mercado tão mutante e nas empresas que têm inovação como estratégia. (Existe alguma que não tem?)
E não vamos nos iludir. Essa autonomia de pensamento, combustível da inovação, não se desenvolve fazendo cursos de criatividade que são muito bons para descondicionar e fazer pensar diferente mas não nos ensinam a amadurecer valores que fundamentem opiniões, identidade e visão de mundo, ponto de partida essencial para se criticar processos, produtos, serviços e o estilo de vida vigente na sociedade.
Essa é uma das diferenças fundamentais entre o Marketing tradicional que, conservadoramente, reverencia o mercado como parâmetro de melhor decisão e o Branding que introduz a identidade da Marca (e consequentemente a de seus gestores) como principal fonte de crítica e inspiração para suas reflexões e decisões inovadoras. Antonio Negri e Michael Hardt, no seu livro “Império”, deixaram claro que as questões mais dramáticas que enfrentamos na atualidade são as crises de identidade e de imaginação.
Eles explicam: quanto à identidade, as pessoas estão desnorteadas porque os referenciais externos que elas costumavam usar para definir seus comportamentos não existem mais. Quanto à imaginação, as pessoas não sabendo mais como funciona esse mundo caótico e supondo que quem manda nele é um poder distante, misterioso e inacessível, não conseguem mais projetar o presente e muito menos imaginar o futuro.
O resultado é triste e perigoso: sem saber quem é e sem condições de imaginar o futuro, as pessoas não conseguem mais interferir na realidade atual, se omitem, se alienam e largam seu destino nas mãos de ninguém, tornando-se energia criativa dispersa, sem foco e de fácil de manipulação. A sociedade entra em processo de empobrecimento, fragmentação e fica à deriva, movida por medo e prazeres imediatos, não por sonhos eprojetos ambiciosos de transformação. As empresas reproduzem essas duas crises no seu dia a dia. E isso é ótimo.
Acredito que os problemas de uma época são desafios que a sociedade precisa enfrentar para evoluir e entrar em outro patamar de produtividade, de qualidade de vida e satisfação; e isso está ligado diretamente à capacidade de inovar em processos, produtos, serviços, controles, tecnologia, relações etc.
Os manuais e as melhores práticas só nos dizem o que deu certo no passado e não garantem nenhum resultado num futuro marcado pela ruptura com o presente.
Na prática, grande chance de inovar e mudar para melhor.
Felizmente, temos boas referências de empresas movidas por lideranças lúcidas e inspiradas que estão investindo corajosamente no amadurecimento de sua gente, isto é, provocando o surgimento do pensamento autônomo e crítico, despertando visões e ambições individuais que vão além dos resultados imediatos de carreira e remuneração.
Claro que essas pessoas, mais críticas e ambiciosas, não ficam satisfeitas com as visões corporativas e os resultados imediatos da empresa. Querem mais.
Daí a necessidade da empresa ampliar a visão e buscar um resultado mais ambicioso que o lucro ou a liderança de mercado que, se de um lado acionam a capacidade de trabalho de um executivo, por outro, fazem muito pouco por sua motivação e inspiração como indivíduo. Para buscar essa visão inspiradora e motivadora, esses líderes focam a marca e tratam de identificar seu propósito, seus compromissos, seu valor para todos os stakeholders. Aí reside uma rica fonte de inspiração para inovação.
É a marca, não a empresa, que tem potencial de emocionar, inspirar e motivar; assim como são as pessoas, não os executivos, que têm potencial de se emocionar, se inspirar e se motivar.
Quem tem dificuldade para inovar, devia parar de planejar e decidir by the book e experimentar sonhar e decidir by the soul. Devia deixar de ser executivo por alguns momentos e experimentar ser humano. Garanto que vai se surpreender muito com sua capacidade de inovar.
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